Incrível: Pedreiro aprendeu a dançar balé para ajudar filhas autistas

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Alô, Comunidade!  Conheça a história de Joilson Santos,54 anos, pedreiro que aprendeu a dançar balé para ajudar as duas filhas autistas.

É em um estúdio de balé, no Centro Cultural Maestro Miro, em Feira de Santana, Bahia, que Jailson vira mais um bailarino.

A família se desloca quase 30 minutos, de carro, do bairro de Viveiros em direção ao espaço, no bairro de Muchila.

A região onde vive é a terceira mais pobre da cidade. O rendimento médio dos moradores da região é de R$ 754, menos da metade do resto do município, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

Na sala ele e a esposa, Jaqueline Amorim, 43 anos, e as filhas, Isabele e Iasmim, encontram outras oito crianças diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista que dançam como método de tratamento. Todas são acompanhadas por mentores e Joilson é o único homem presente.

“Onde que eu imaginava que ia fazer isso?”, brinca.

Meia preta

Nos pés, o pedreiro calça uma meia preta que substitui a falta de uma sapatilha. A camisa de todos é preta para destacar o azul da roupa das crianças.

É a primeira vez que tem qualquer proximidade com balé. As marcas nas pernas e braços mostram uma vida de trabalho braçal. Há 28 anos, Joilson é pedreiro. A casa onde treina com as filhas foi construída por ele, há 10 anos.

”Se tá sendo bom para elas, está sendo bom para mim”, diz Joilson, antes do começo da aula.

Numa aula improvisada na manhã do último domingo especialmente para a reportagem do Correio da Bahia, Joilson traz à sua frente Isabele, 8.

Antes das aulas do chamado Ballet Azul, iniciadas no dia 8 de março, a menina sequer falava. A esposa Jaqueline, é responsável por Iasmin, 10. As duas foram diagnosticadas há sete anos, quando a mãe desconfiou de comportamentos autoagressivos, como bater a própria cabeça contra objetos.

Joilson e Jaqueline com as filhas autistas/ Foto: Correio

Aulas

A aula começa sempre às 10h40. Pessoas diagnosticadas com autismo tem fixação na rotina.

O pedreiro aprende os passos aos poucos. Quando a filha erra um movimento, o pai tenta corrigi-la, mostra como se faz.

Os nomes franceses das posições também são um desafio. Nos treinamentos em casa, ele repete para lembrar.

“Quando que imaginei que meu marido, bruto desse jeito, ia dançar balé“, brinca Jaqueline. Os pais estão em busca de uma escola na cidade que receba as meninas.

No primeiro dia de aula, o plano nem era participar, já que o horário do trabalho era próximo. Na portaria, ele olhou para a esposa e as duas filhas, já arrumadas como bailarinas.

“Não posso deixar Isabele sozinha”, falou. O pedreiro desceu do carro e perguntou se poderia ficar na sala. Desde então, às quartas e sextas, Joilson tem a mesma rotina, como se os dias de balé fossem   de uma vida.

Foi na noite de 7 de agosto que Jailson pisou pela primeira vez num palco.  A plateia não tirava os olhos dele, único pai na apresentação. O diretor de atividades culturais, Luiz Augusto Oliveira, chegou a apresentá-lo a algumas pessoas.

“Mas ele é muito tranquilo. É o comportamento de quem sabe que está fazendo o que se deve fazer, sem nenhum afetamento, nenhuma exibição”, lembra Luiz.

A notícia da apresentação de Joilson ao lado das filhas logo se espalhou pela vizinhança de Viveiros. Na manhã do dia seguinte, a família, dentro de casa, ouviu o barulho no portão.

Do lado de fora, uma voz gritava para que “ele virasse homem”. “Não gosto nem de falar sobre isso, já falaram muita coisa feia para a gente”, lembra Jaqueline.

Na família e entre amigos, os comentários logo apareceram. O irmão Juaci Salomé, 50, estranhou. “Tá fazendo balé agora, Joilson?”.

Até então, o mais velho dos sete filhos da família era um homem reservado, “rústico”, nas palavras do irmão.

“Achei estranho, ele é o mais rústico da família. Mas vi depois que ele tem sensibilidade a ponto de aprender até balé para ajudar as filhas”, diz Juaci.

O pai, já falecido, é uma de suas inspirações. “Meu pai falava: no dia que um homem perder o nome dele, ele perde tudo que tem. Quero dar conforto às minhas filhas”, lembra.

No trabalho, os colegas também fizeram chacota. “Quer dizer que você é bruto aqui, mas lá é mansinho”, repete, Joilson, em tom de brincadeira. Hoje, não dá mais importância.

“Aqui é discriminação de tudo”, resume Joilson.

A notícia do pedreiro-bailarino ainda rende no bairro. Na vizinhança, chegaram a pedir desculpa por comentários anteriores. Nenhum deles tirou Joilson do estúdio de balé. Exceto no último mês, quando começou um trabalho temporário como pedreiro na praia de Cabuçu, no Recôncavo Baiano.

Agora, passa 15 dias fora e 15 dias em casa. Quando retorna, a primeira atividade é arrumar a sala para as horas de balé, treinado de maneira improvisada em casa.

O projeto

No primeiro dia de aula, as meninas corriam em círculos dentro do estúdio. Algumas gritavam, sem entender onde estavam e o que deveriam fazer. As aulas precisaram começar como se o balé fosse uma brincadeira.

O professor criava formas alternativas para falar dos nomes dos passos. O pliê, por exemplo, movimento de flexão dos joelhos, se tornou o “dobra e estica”. Os verdadeiros nomes são inseridos na rotina gradativamente.

A faixa de idade varia de 5 a 10 anos. É a primeira turma do chamado Ballet Azul, cor utilizada para representar o autismo. É também a primeira vez que se tem registro, no Brasil, de aulas de balé para pessoas autistas com acompanhamento dos pais.

“Percebi que os pais seriam grandes mentores. Comecei a pedir que eles repassassem tudo que era ensinado aqui. Vi que começaram a interagir bem mais”, explica o professor Adauto Silva.

As aulas gratuitas são do projeto Arte de Viver, mantido pela Prefeitura de Feira de Santana, e aberto a doações. Somente as crianças, por exemplo, têm roupa apropriada para o balé.

Mundo particular

Antes dos minutos finais, as meninas são convidadas a seguir, sozinhas e na ponta dos pés, uma linha reta. O caminho é aberto por Eduarda, 6, que saltita e sorri. “Ela não tinha coordenação motora nenhuma, não fazia isso. Não pulava, não andava”, conta a mãe Joseni Melo, 44.  Logo depois, Eliza, 5, trilha o mesmo caminho, com as mãos suspensas para os lados.

O autismo é um transtorno caracterizado, principalmente, nas alterações na forma de se comunicar com o mundo exterior, seja por meio de palavras ou ações.

As conexões cerebrais, entre um neurônio e outro, são mais curtas, frágeis e desorganizadas que o normal. O resultado são padrões como a fixação em comportamentos repetitivos e a inflexibilidade, explica a neuropediatra Cecília Passos.

“O que se observa com grande frequência são crianças que não mantém uma qualidade no olhar, não conseguem iniciar diálogos”, diz.

A Organização Mundial da Saúde estima que uma a cada 160 crianças tenha autismo. São diferentes graus do transtorno. No estúdio de dança, por exemplo, há crianças totalmente reservadas, enquanto outras brincam entre si.

Fotos: Correio da Bahia

Com informações Correio da Bahia


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