Reflexão: Discutindo política e religião

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Alô, Comunidade! Hoje, sexta-feira, 11 de setembro, é dia de coluna!!

O Advogado e membro da comissão dos direitos humanos da OAB, subseção de Criciúma, Santa Catarina, Jorge Miguel Nascimento Guerra, vai trazer textos de inquietações que acontecem com frequência em nossa sociedade.

No texto de hoje o advogado traz uma reflexão sobre a importância de se falar a respeito de política e religião.Confira:

Acredito que não se discutir religião e política como assuntos corriqueiros e cotidianos (de muita importância), deixamos, enquanto sociedade, de refletir sobre qual seria ou deveria ser o limite da religião e da política e, principalmente, sobre os aspectos que possam surgir a partir dessa união perigosa e tivemos, recentemente, dois exemplos de como a religião está se arvorando sobre questões que já estão postas e sequer são passíveis de revisão.

Por Jorge Miguel N. Guerra

Discutindo política e religião

Advogado, Jorge Migue N. Guerra

Diz o ditado popular que “política e religião não se discute” e eu não poderia discordar mais dessa afirmação. Impedir que temas como estes sejam debatidos os coloca num lugar de desconhecimento e obscuridade muito perigosos, podendo gerar cenários como a constante presença de figuras religiosas nos cargos políticos baseando a suas atuações em princípios religiosos ao invés de políticos.

A famigerada bancada evangélica, que nem deveria existir, sempre foi um problema quando falamos em leis e em políticas públicas que versem sobre temas como educação sexual para crianças, descriminalização do aborto ou quaisquer garantias à população LGBTQIA+. Muito infelizmente o Brasil ainda é um país muito atrasado nessas questões e a culpa disso repousa no conservadorismo religioso (que não é representado por uma única religião) que acabou por eleger um presidente que se diz evangélico e que usou a religião como um dos pontos fortes da sua campanha.

Após eleito, o presidente seguiu com a sua religiosa, tendo, curiosamente, nomeado uma ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos que fez questão de dizer em seu discurso de posse que “O Estado é laico, mas esta ministra é terrivelmente cristã”.

Preciso destacar aqui que o representante pode seguir qualquer religião com a qual se identifique, uma vez que o estado se pretenda laico. O problema surge quando este representante insere os princípios religiosos na sua atuação política, que não pode e nem deve ser direcionada apenas àqueles que comungam das mesmas crenças que ele.

Acredito que não se discutir religião e política como assuntos corriqueiros e cotidianos (de muita importância), deixamos, enquanto sociedade, de refletir sobre qual seria ou deveria ser o limite da religião e da política e, principalmente, sobre os aspectos que possam surgir a partir dessa união perigosa e tivemos, recentemente, dois exemplos de como a religião está se arvorando sobre questões que já estão postas e sequer são passíveis de revisão.

Uma criança que foi estuprada por seu tio desde os seis anos de idade estava grávida, aos dez, e precisou fazer um aborto conforme garantem, neste caso, ambos os incisos do o artigo 128 do Código Penal brasileiro (gravidez fruto de estupro e representando risco à vida da gestante).Ocorre que, com a autorização para a interrupção da gravidez, um grupo de católicos foi à porta do hospital protestar contra o procedimento, chegando ao ponto de chamar a vítima, uma criança com apenas dez anos de idade, de assassina. Além dessa completa bizarrice, diversos parlamentares religiosos aproveitaram o caso para se posicionar contra o aborto nas redes sociais, tratando-o como uma questão meramente religiosa. E aqui faço mais um recorte: O problema não é ser contra ou a favor da descriminalização do aborto e sim ser contra, enquanto político, por questões religiosas.

Outro caso em que a religião ganhou os holofotes nos últimos dias foi o suposto assassinato cometido pela pastora e deputada federal pelo Rio de Janeiro, Flordelis. Ela é a interseção perfeita entre religião e política, uma vez que tenha se tornado famosa por sua atuação como pastora, trabalhando com jovens nas favelas e adotando-os, chegando ao ponto de ter mais de cinquenta filhos. A suspeita é de que ela tenha tramado o assassinato do marido (que inicialmente tinha sido adotado como filho) com alguns outros filhos.

Ocorre que após a repercussão deste caso na internet, alguns evangélicos foram às redes sociais para dizer que ela não os representa e que a religião não deve ser considerada como um fato relevante para o caso. No entanto, ainda sigo com algumas críticas quanto a este posicionamento.

A bancada religiosa brasileira é famosa por ser barulhenta na defesa dos interesses religiosos em detrimento de questões públicas, como já citado acima. Mesmo fora do contexto político, religiosos estão constantemente opinando sobre questões de interesse público. As falácias dos tão temidos “kit gay” e “ideologia de gênero” surgiram a partir de políticos conservadores e religiosos, com o apoio de diversos líderes religiosos pregando contra essas políticas em seus púlpitos, bem como muito deles pregaram em apoio ao atual presidente.

Assim, me parece insuficiente que a comunidade religiosa se limite a dizer que determinada pessoa ou grupo não representa todo o grupo religioso quando essas religiões, enquanto instituições, estejam constantemente se envolvendo politicamente em favor de seus interesses e, oportunamente, se calando quando a repercussão é negativa como nos casos dos religiosos que foram ao hospital ou ao fato de Flordelis ser uma representante religiosa no congresso.

Devemos todos ser a favor de toda e qualquer manifestação religiosa, uma vez que a constituição garanta esse direito. No entanto, a constituição também nos diz que o Estado é laico e este ponto nem sempre é respeitado. Devemos sim discutir cada vez mais política, religião e tantos quantos forem os temas dados como sensíveis ou polêmicos porque essa é a única forma de superá-los.

 

 


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